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Place Saint-Michel – a praça dos encontros em Paris

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Um dos lugares mais lembrados como ponto de encontro em Paris é a Place Saint-Michel. Não é à toa que, passeando por ali, sempre vemos ao menos uma pessoa em pé, esperando alguém. Mas a charmosa praça tem muitas histórias e curiosidades a contar.

Place Saint-Michel

História
Em meados do século XIX, durante o império de Napoleão III, o prefeito de Paris, barão Georges Eugène Haussmann, promoveu uma ampla reforma na capital. Ele criou bulevares, praças e promoveu outras mudanças urbanas a fim de melhorar a circulação pela cidade. Dentre elas, estava prevista a abertura de um novo bulevar como prolongamento do Boulevard de Sébastopol.

Place Saint-Michel

Este novo bulevar seria entre o Pont (ponte) au Change até o Observatoire (perto do Jardin du Luxembourg). Os trabalhos começam em 1859. Em um primeiro momento, o nome da nova via é Boulevard de Sébastopol Prolongé (prolongado). Até que, em 1864, ele é “dividido” em dois e ganha novos nomes: a primeira parte, do final da Pont au Change até a Pont Saint-Michel e que passa pela Île de la Cité, passa a se chamar Boulevard du Palais. E a segunda, que vai da Pont Saint-Michel até o Observatoire, recebe o nome de Boulevard Saint-Michel.

Boulevard Saint-Michel
O Boulevard Saint-Michel visto da praça

Acontece que o Segundo Império era obsessivo com perspectivas e pontos de vista. E ali, na saída da Pont Saint-Michel, não havia uma boa perspectiva do novo bulevar de mesmo nome, já que havia um imóvel que fazia a bifurcação da nova via com a rua Danton e atrapalhava a perfeição do lugar. Então, decidiu-se construir uma praça “encostada” neste ímovel.

Place Saint-Michel
A fonte “abraça” toda a altura do imóvel

É assim que vai nascer a Place Saint-Michel, uma praça mirante, pois foi criada para dar uma perspectiva monumental do Boulevard Saint-Michel a partir da ponte. Também seria a entrada triunfal para o mesmo bulevar. Para embelezar ainda mais essa parte da cidade, ficou decidida a reconstrução das pontes: Pont au Change e Saint-Michel.

Place Saint-Michel
A Força

Como em muitos trabalhos do Barão Haussmann, a abertura da Place Saint-Michel provoca o desaparecimento de pequenas vias, como a rue de l’Hirondelle e uma parte da rua Saint-André-des-Arts. O nome Saint-Michel (São Miguel) é devido a uma antiga praça que havia ali perto, mas não exatamente no mesmo lugar, e que desapareceu na construção do Boulevard Saint-Michel.

Vista da praça
Vista a partir da Fontaine Saint-Michel

Para a construção da praça, Haussmann chamou o jovem arquiteto Gabriel Davioud, que mais tarde seria conhecido como um dos arquitetos mais famosos do Segundo Império. A ideia de Davioud era criar uma praça, cercada por construções uniformes e algumas árvores, tendo como elemento principal uma fonte monumental. A fonte seria o elemento-chave para “disfarçar” a parede do imóvel que estragava a perspectiva.

Place Saint-Michel
Olhem como a fonte disfarça bem a parede do imóvel

O fato de ter uma fonte também seria um triunfo para o Segundo Império, pois, até pouco tempo antes, a falta de água era uma realidade em Paris. E a construção de fontes pela capital mostrava que o governo havia resolvido este problema. Tanto que Eugène Belgrand, responsável pelo abastecimento de água na cidade e pela criação de parques e jardins, também supervisiona a criação da praça, ao lado de Davioud.

Fontaine

A Fontaine Saint-Michel
Concebida à maneira de um arco do triunfo, a fonte (fontaine) tem 26 metros de altura e 15 de largura. Colunas coríntias de mármore vermelho do Languedoc (região francesa) emolduram um nicho onde está Saint Michel (São Miguel em português) derrotando o demônio, quase jogando-o nas águas. A estátua de bronze, inspirada em uma obra de Rafael, hoje no Louvre, foi realizada por Francisque Duret e simboliza a luta entre o Bem e o Mal.

Estátua São Miguel

De cada lado do nicho, como mencionei acima, duas colunas de mármore vermelho. Entre as colunas, um escudo com o lema de Paris. Logo acima de cada uma delas, está uma cabeça de leão, que faz parte de uma frisa. Tudo isso sustenta quatro esculturas representando as quatro virtudes cardeais: A Prudência, esculpida por Jean-Auguste Baure; A Justiça segurando uma espada, obra de Élias Robert; A Temperança, realizada por Charles Gumery, e a Força com a clava de Hércules, vestida com a pele do leão de Néméia, do escultor Hyacinthe Debay. Nos intervalos das estátuas, vemos escudos com referências a Saint Michel.

Place Saint-Michel
A Justiça

As guirlandas e os anjinhos da frisa e acima do nicho foram esculpidos por Noémie Constant e colocados um pouco depois, em 1863. Um frontão de estilo renascentista coroa o conjunto. No centro dele, há uma inscrição comemorativa, que diz: “Fontaine Saint-Michel. Sob o reino de Napoleão III, imperador dos franceses, este monumento foi construído pela cidade de Paris, no ano MDCCCLX”. E, acima de tudo, há um barco, que representa a cidade de Paris, cercado pelas alegorias do Poder e da Moderação.

Place Saint-Michel

Símbolo de Paris
O barco – símbolo de Paris

Duas quimeras aladas, que ficam uma de frente para a outra, realizadas em bronze por Henri-Alfred Jacquemart, cospem a água, que corre por três degraus e vai parar em um tanque semi-circular. O líquido jorra a sete metros de altura.

Quimeras aladas

Como a orientação da fonte não é favorável, ela recebe pouca iluminação natural. Gabriel Davioud tentou compensar esse “defeito” através do emprego de pedras coloridas no monumento. Há mármores vermelho, branco e verde. Além deles, o tanque é em pedra de Saint-Ylie (da região do Jura, na França), de um cinza meio amarelado; o rochedo de Saint Michel é em pedra azul de Soignies (Bélgica); e o resto da elevação da fonte é em pedra branca de Banc Royal de Méry (um calcário da região do Oise, perto de Paris).

Place Saint-Michel

O conjunto da Fontaine é inspirado no Arc de Triomphe du Carrousel du Louvre, de 1809. E não é à toa: a fonte deseja fazer uma homenagem ao Primeiro Império e seu prestígio. Inclusive, a ideia original de Davioud era colocar uma estátua de Napoleão I ali onde está Saint Michel. Não vamos nos esquecer que estamos em pleno Segundo Império e o imperador, Napoleão III, era sobrinho de Napoleão I, o Bonaparte. Assim, ao glorificar o governo de seu ancestral, Napoleão, o III, glorifica o próprio império.

Conjunto fonte

Os imóveis homogêneos que Gabriel Davioud concebeu para Place Saint-Michel foram inspirados nos que Charles Percier desenhou para a Rue de Rivoli, durante o Primeiro Império. E tem mais: a Place Saint-Michel foi inaugurada em 15 de agosto de 1860, dia do aniversário de Napoleão I.

Place Saint-Michel

Uma multidão estava presente nesse dia, curiosa, pois, até o final dos trabalhos, a Fontaine estava escondida por uma espécie de véu. Porém, a recepção do monumento é dividida. Várias pessoas reprovam a praça por ser encostada no imóvel (aquele que estragava a perspectiva). Outras dizem: “Neste monumento execrável, não vemos nem talento, nem gosto. O diabo não vale nada, Saint Michel não vale o diabo”.

Baixo relevo Atributos São Miguel

Curiosidades sobre a Place Saint-Michel
1) Na época da Commune de Paris, 1871, Davioud teve medo de ver sua fonte destruída, por causa das alusões aos Primeiro e Segundo Impérios. Porém, em 24 de dezembro de 1872, ele foi encarregado pela prefeitura de Paris de diversos trabalhos de reparação pela cidade. Foi o alívio e a constatação de que sua obra era validada pela República.

Escudo de Paris
Lema de Paris: “Fluctuat nec mergitur”, o que significa, em tradução livre: “É atingido pelas ondas, mas não afunda”

2) No número 1 da praça, havia o Caveau du Soleil d’Or é frequentado por artistas e intelectuais. Alguns de seus habitués eram Alfred Jarry, Apollinaire, Max Jacob, Picasso, por exemplo. O local também era a sede das reuniões da revista literária e artística La Plume.

Place Saint-Michel

3) De 19 a 25 de agosto de 1944, a Place Saint-Michel foi palco de um evento importante entre os ocupantes alemães e as FFIs (Forces Françaises de l’Intérieur), que faziam parte da Resistência Francesa e lutavam contra os alemães.

Frisa anjinhos

É que perto da praça, do outro lado do Sena, a polícia parisiense, em greve, se insurge contra o comando alemão e invade, na manhã de 19 de agosto, a Prèfecture de Police (a polícia responsável pela capital e arredores), localizada ali perto, na Île de la Cité. A ordem era a insurreição geral, com o patrulhamento de Paris e a ocupação de edifícios públicos, fábricas, estações etc, para facilitar a chegada dos Aliados e a Liberação de Paris.

A Prudência

Como o Boulevard Saint-Michel, e consequentemente a praça, eram lugares de passagem para as tropas alemãs, a ideia da FFI foi ocupar a Place Saint-Michel para impedir os alemães de se deslocarem e chegarem à Préfecture de Police. Em 21 de agosto, barricadas começaram a ser erguidas na praça e nos arredores. Os moradores dos V e VI arrondisssements (distritos) tomaram parte nos combates ao lado das FFIs. O grupo de Resistentes reunido aqui será batizado de Maquis Saint-Séverin, por causa da igreja de mesmo nome no Quartier Latin. Maquis é um termo inicialmente utilizado para denominar o lugar onde grupos da Resistência Francesa se reuniam e depois passou a ser usado também para denominar os próprios grupos e suas organizações.

Place Saint-Michel
Uma das placas lembrando o combate de 1944

Os enfrentamentos fazem vários mortos do lado da Resistência Francesa. Assim, a Place Saint-Michel tem duas placas colocadas na fonte lembrando o evento. Em uma está escrito: “À memória dos soldados das Forces Françaises de l’Intérieur e dos habitantes dos V e VI arrondissements que, neste lugar, encontraram a morte combatendo”. Já na outra placa, lemos: “No ano MCMXLIV (1944). Do 19 a 25 de agosto, após cinquenta meses de ocupação alemã, o povo de Paris, com a aproximação dos exércitos libertadores, se revolta contra a opressão”

Place Saint-Michel
A outra placa lembrando os acontecimentos de 1944 na praça

4) Nos protestos de maio de 1968, a Place Saint-Michel é novamente palco de confrontos, desta vez entre os policiais franceses e os estudantes.

relevo da fontaine Saint-Michel

5) Ao longo do tempo, a Place Saint-Michel foi servindo de inspiração para vários artistas, como os pintores que retratavam Paris em suas obras. Alguns exemplos: Eugène Galien-Laloue (1854-1941), Édouard Léon Cortès (1882-1969) e Antoine Blanchard (1910-1988).

Place Saint-Michel
Eugène Galien-Laloue – Place Saint-Michel, começo do século XX

Hoje, a Place Saint-Michel, apesar de pequena, é um dos lugares mais apreciados de Paris. Além de ser local de ponto de encontro, como mencionei no início do texto, é um lugar de passagem, pois embaixo dela estão o metrô e o RER (o trem que vai para os subúrbios). E também as ruas dos arredores, cheias de lojas, cinemas e restaurantes, atraem muitas pessoas, que acabam passando pela praça. Por isso, ela é um lugar alegre e movimentado.

Place Saint-Michel

A Place Saint-Michel também é palco para apresentações musicais ou de dança, o que atrai muita gente, muitas vezes até tarde da noite. É como se fosse um aperitivo da animação do Quartier Latin. E ainda tem a proximidade com o rio Sena para dar ainda mais movimento à praça. As luminárias antigas e a entrada Art-Nouveau de Hector Guimard para o metrô, junto com a própria fonte, tornam a Place Saint-Michel ainda mais charmosa.

Place Saint-Michel

O comércio que a rodeia está mudando: muitas lojas tradicionais foram para outro lugar ou fecharam as portas. Mas espero que essas mudanças, até normais em lugares antigos como este, não alterem a identidade e a personalidade democrática que a Place Saint-Michel sempre teve.

Place Saint-Michel
A Temperança

Place Saint-Michel
75005 – Paris
Metrô: Saint-Michel, linha 4
Cluny-La Sorbonne, linha 10 (andando cinco minutos).
RER B e RER C – Saint-Michel-Notre-Dame

Place Saint-Michel

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